Coluna Geremias Pignaton: O Prato

Coluna Geremias Pignaton: O Prato

De como uma nova tecnologia é recebida pelo povo.

Ele vivia e sustentava a sua grande família de um pequeno comércio no final da rua. Vendia de tudo. Era daqueles comércios do interior que ia do querosene à farinha de mandioca, da sela de cavalo ao grampo de cabelo, da marmelada ao veneno para formiga.

Corria lá pelo meio da década de 1980. Ele na sua rotina de abrir a loja por volta das 7 da manhã e fechar quando a noite se prenunciava. Após fechar, tinha o que hoje chamamos de happy hour. Na venda do Mauro, reunia-se com alguns amigos, tomava umas cachacinhas e cervejas. Uma hora depois, ia até o centro da cidade para a continuação no bar do Adelino, onde permanecia até lá pelas 9 da noite. Só então, já meio altinho - algumas vezes bem mais do que isso -, ia para casa.

Naquele dia, chegou ao Mauro e encontrou o grupo de amigos muito animados. O assunto era um prato, de cor âmbar, que estava na mão do Zeca. De repente, jogaram o objeto no chão, ao seus pés, quicando. Não quebrou. Ele assustou-se, pulou para trás e depois o apanhou, sob a risada de todos.

Olhou atentamente o objeto, nunca antes visto, com muita curiosidade. O prato tinha, colado no fundo, um selo prateado escrito: “Duralex, muito difícil de quebrar!” Um amigo gritou: é inquebrável!

Tomaram as cachaças e cervejas de sempre, comeram os tira-gostos de linguiça, carne-seca e queijo, também de sempre. Brincaram com o prato com todos os amigos que chegaram. Jogaram pra cá e pra lá. Houve uma ocasião que um amigo mais exaltado o jogou no meio do calçamento da rua. O bravíssimo prato conservava-se intacto, alheio a todas exageradas provas a sua condição de quase inquebrável.

Antes de sair do Mauro, nosso amigo comprou um desses novos pratos para levar ao bar do Adelino. Chegando ao local, nem esperou entrar, lá de fora mesmo, atirou o prato em direção aos pés de um grupo de amigos que bebiam no balcão. Pularam de susto e gritaram raivosos com ele, que ria de se contorcer na soleira da porta.

Como ocorreu na venda do Mauro, ali também passaram mais de hora bebendo, rindo, brincando e atirando o prato ao chão, pra lá e pra cá.

Ele foi para casa mais cedo do que o normal. Estava ansioso para mostrar a novidade à esposa e aos filhos. Encontrou a mulher ao pé da pia da cozinha, lavando a louça do jantar dos meninos. Atirou o bravo Duralex em direção às mãos da esposa, gritando: pega! Ela deu um pulo para trás e, com as mãos, defendeu-se do prato que lhe atingiria a barriga, fazendo-o cair ao chão. Seguiu-se um estouro, quase como uma bomba junina. O prato se partiu em centenas de pequenos fragmentos. Esfarelou-se!

Após o susto, ela olhou para ele, que estava boquiaberto com os olhos arregalados, e gritou: você tem que parar de beber. A bebida está te deixando doido!

As crianças adentraram a cozinha correndo, curiosas e assustadas com aquela algazarra toda.